Microbiota intestinal equilibrada igual a longevidade saudável, entenda

Você faz planejamento financeiro? Tem uma previdência privada para a fase da vida em que pretende aproveitar os netos? E o seu metabolismo? Está incluído nessa programação? A sequência de perguntas é do nutricionista, especialista em modulação intestinal, Murilo Pereira.  

A provocação à reflexão tem explicação simples: a construção da longevidade saudável tem passagem obrigatória pela alimentação e atividades físicas diárias.  

“Se você tiver guardado dinheiro, ok. Mas você precisará se locomover, pegar essa criança no colo. Você precisará ter qualidade de vida. Então, quanto você está fazendo agora de atividade física para ter uma memória muscular?”, questiona. 

A reserva de músculos fortalecidos está atrelada à anos com mais disposição e força, com um bônus: “Se você malhou, se você fez atividade física, você merece um carboidrato, você merece um doce. E quando você comer, coma feliz, porque nada pior do que o rancor depois e a culpa. Coma feliz e está tudo bem”, aconselha o especialista. 

Moderação 


O estímulo à felicidade conquistada ao comer o quitute vem acompanhado de uma informação que convida à moderação: o Brasil é o maior consumidor per capita de bebidas açucaradas do mundo.  

O dado foi revelado num artigo publicado em 2022 na revista científica Nature Reviews Endocrinology. Os pesquisadores fracionaram o mundo em sete macrorregiões e compararam a média de consumo de açúcares entre cada local. O Brasil – com suas proporções continentais – se destacou tanto na comparação regional quanto mundial.  

Antes disso, em 2016, outra pesquisa científica já previa essa disparada na ingestão de açúcares. O documento divulgado na Nature Reviews Gastroenterology & Hepatology apontava para um futuro preocupante. Os cientistas previam que, em 2025, o valor arrecadado pelos impostos cobrados por alimentos ultraprocessados não será suficiente para cobrir as despesas de tratamento de obesidade e resistência à insulina. 

O caminho para reverter essa tendência é a comida de verdade – o prato montado com ingredientes in natura, frescos, com a proporção recomendada de macro e micronutrientes para entregar ao corpo a quantidade de energia que ele precisa para as atividades diárias. Mas, não apenas.  

A escolha do que vai no prato reflete também na composição da microbiota intestinal – o conjunto de bactérias que confere ao intestino o título de “segundo cérebro”. Composto por milhões de neurônios e bilhões de bactérias, o órgão tem comunicação direta num eixo intestino-cérebro, o que justifica a influência, inclusive, na saúde mental.  

Overnutrition  


Os carboidratos e açúcares surgem nesse contexto num conceito estabelecido ao longo dos últimos anos nomeado de overnutrition, ou, consumo excessivo de determinados nutrientes.  

A monotonia alimentar induzida pelo perfil dos alimentos escolhidos diariamente por quem não tem hábitos alimentares saudáveis tem a capacidade de mudar a microbiota intestinal e reduzir a diversidade microbiana – o que pode auxiliar ou prejudicar o comportamento cerebral.  

Descoberta que começou a ser aprofundada em 2007, com o surgimento de um método de análise da microbiota intestinal que cravou a nova expectativa de vida dos microorganismos no intestino.  

Murilo Pereira lista ainda outro marco significativo em 2012, com as revisões de publicações relevantes dos cinco anos anteriores de pesquisa e um mais recente, em 2017, quando cientistas responsáveis pelos guidelines de nutrição e saúde intestinal revisaram uma nova leva de estudos e concluíram que o número de células humanas é igual ao número de células microbianas – reforçando a importância da microbiota intestinal no funcionamento do organismo.  


E o açúcar? 


O impacto do consumo do açúcar, segundo o especialista, depende da frequência do consumo. Quando presente de forma crônica no organismo, esse componente induz o corpo a uma seleção natural pelo nutriente. 

Murilo afirma que o consumo crônico pode, sim, ser benéfico no caso de atletas intra-prova de maratona, por exemplo. Isso porque o organismo posto numa situação extrema, com a da competição, demanda mais carboidratos (importante lembrar: todo carboidrato é convertido em glicose).  

“Nós podemos treinar o nosso intestino para absorver de forma mais efetiva esse carboidrato, porque a gente precisa de energia intra-prova. É ótimo ter carboidrato chegando muito tempo nesse intestino e, inclusive, tem como treinar o intestino para absorver mais rápido ainda a glicose. Existe um receptor no epitélio intestinal chamado SGLT1 e estimular o receptor SGLT1 vai melhorar a capacidade de captura da glicose, melhorando a performance dessa glicose para nutrir as células do corpo que estão em fase de gasto energético para o exercício”, detalha o especialista. 

Por sua vez, no caso de indivíduos sedentários, a absorção muito veloz da glicose, induzida pelo consumo excessivo de açúcares e ultraprocessados, causa efeitos metabólicos indesejáveis – que podem levar ao desenvolvimento de uma série de patologias, como a obesidade e, até mesmo, câncer colorretal. 

Microbioma restrito 


Na contramão da alimentação densamente nutritiva, que propicia um ambiente equilibrado na microbiota intestinal, a alimentação com oferta limitada de nutrientes e cronicamente abastecida por açúcares não tem o predomínio de uma variabilidade de microrganismos.  

“Essa monotonia faz com que o intestino tenha uma condição de micro-organismos que produzem menos ácido graxo de cadeia curta – e é o excesso deles que geram nutrição dos colonócitos, que geram energia para dar integridade ao cólon. Por isso, hoje nós estamos vivendo um mundo de câncer colorretal ganhando uma notoriedade”, explica.


No prato  


Se o alimento ingerido leva ao desenvolvimento de doenças, é a composição diária do que você consome que conduz às condições para a saúde plena.  

As fibras são aliadas potentes no processo de restabelecimento do equilíbrio do microbioma intestinal. A orientação é que o alimento seja consumido inteiro, na integralidade, com compostos fenólicos e fibras alimentares.  

A longo prazo, o consumo de alimentos ricos em fibras reflete na saciedade, na diversidade do microbioma, em metabólicos adequados e menos desconforto – que tende a diminuir, gradativamente conforme os alimentos forem inseridos na rotina. 

Algumas sugestões são os cereais integrais, como a aveia, sementes como a linhaça, frutas como a maçã e legumes como a cenoura, além de féculas como a batata e a mandioca.  

Alimentos acessíveis, simples de serem adicionados às receitas convencionais e que são excelentes investimentos para uma microbiota equilibrada e uma vida longeva e com saúde para usufruir dos seus planejamentos para o futuro!